AVENIDA BRASIL: É POSSÍVEL TIRAR DA ALMA O PESO DA MÁGOA?
A atual novela global das nove, Avenida Brasil, trama de João Emanuel Carneiro, destaca um tema bastante oportuno: a vingança. O enredo até o momento relaciona as faces atuais do dilema ancestral da humanidade: perdoar ou vingar-se. Essa luta entre a decisão sábia que leva à reconciliação e o desejo de vingança é mais antiga que a civilização e continua sendo travada nos dias atuais. O folhetim até agora ressaltou que parece fazer parte do mecanismo instintivo de defesa dos ser humano responder a um tapa com outro tapa: o famoso “olho por olho, dente por dente” (Lv 24,20).
A vilã Carminha (Adriana Esteves) é uma mulher cruel, ambiciosa, que procura a qualquer custo “subir na vida”; e, como ninguém, sabe dissimular a maldade de suas ações. A sua vítima é Rita (Mel Maia), que na infância enfrentou a morte do pai e a madrasta má. Agora, adulta, depois de viver um tempo no lixão, ser adotada e viver um tempo na Argentina, volta para o Brasil com o nome de Nina (Debora Falabella), e, com essa ferida mais forte que nunca, consegue vaga de cozinheira na casa de Carminha e planeja milimetricamente vingar-se dela.
Mas o que move o ser humano a querer se vingar? A vingança é um desejo humano de que o agressor sinta na própria pele a dor e as angústias que ele mesmo causou a alguém. Muita gente destrói sua vida com o veneno da amargura, do rancor e do ódio. O fato de não perdoarmos aqueles que nos ofenderam pode nos custa uma vida de imensa tortura. E, infelizmente, essa é a primeira reação a se manifestar.
Por outro lado, o perdão aparece como a capacidade que todos nós temos de ruminar a situação negativa provocada pelo agressor contra nós, e, neste ato de reflexão, chegarmos a “aceitação” de que o acontecido deve ser deixado de lado para que reine a paz. Se conseguirmos cancelar plenamente este sentimento negativo, é porque o perdão foi total.
Dessa forma, o perdão se apresenta como uma característica natural do ser humano porque a humanidade tem por trás da sua evolução uma influência religiosa muito grande; por isso, ele é necessário na medida em que é impossível termos uma relação de plena comunhão com Deus, estando magoado com alguém.
Obviamente que não existe nenhum relacionamento imune a dificuldades, problemas, discussões, ofensas; mas faz justamente o perdão ser necessário para que essas relações possam continuar seja do ponto de vista conjugal, familiar, comunitário. E quanto mais íntima for a relação, maior a necessidade do perdão, já que se torna mais alta a possibilidade de existência de conflitos.
Mas, podemos ainda perguntar: se o perdão é uma coisa natural, porque é tão difícil? Porque intelectualmente, todos nós somos até capazes de perdoar, o problema é que se a situação provoca uma dor emocional muito grande, então o perdão se torna mais complicado para acontecer. São muito convincentes e fortes as cenas da novela em que Nina lembra as maldades da madrasta e chora de tanta dor.
É certo que existe o perdão total, mas até lá há um longo caminho a ser percorrido. Tudo depende do tamanho dos danos emocionais que a situação provoca. Se temos uma desavença com alguém, e encontramos esse alguém, e já não sentimos nenhuma emoção negativa, significa que a situação já foi superada. Mas, quando encontramos essa pessoa, e nos desviamos dela, podemos até dizer: já não tenho mais nada contra aquela pessoa, mas prefiro não me encontrar com ela; ainda existe um sentimento negativo que impede a relação plena, por isso, o perdão não foi pleno, embora já possamos considerá-lo como um perdão “parcial”.
Tem gente que admite com muita sinceridade ter dificuldade para perdoar, mas que demonstra abertura para essa possibilidade, e, de fato, este é o primeiro passo para o perdão. Nosso problema é que nos custa admitirmos para nós mesmos que temos essa dificuldade.
Toda vez que o ser humano tenta responder um tapa com outro tapa, o quadro de tensão inicial tem como conseqüência um fato novo e, quase sempre, mais grave. É por isso que a máxima de Jesus de darmos a outra face quando somos agredidos é clara (Mt 5,39). A atitude pacificadora, o perdão, é sempre a saída mais sábia.
Assim, se quisermos realmente perdoar, temos que experimentar o amor misericordioso do Coração de Deus em nossas vidas, perdoando primeiramente a nós mesmos de toda culpa e vergonha para poder perdoarmos a quem nos ofendeu. Precisamos nos lembrar que Jesus foi o primeiro a dar o exemplo quando perdoou aqueles que o crucificaram, intercedendo ao Pai por eles: “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34) e nos ensinando a fazer o mesmo: “Senhor, quantas vezes perdoarei ao meu irmão, quando ele pecar contra mim? Será até sete vezes? Jesus lhe respondeu: Eu não vos digo até sete vezes, mas até setenta vezes” (Mt 18,21).
Pe. Carlos Henrique de Jesus Nascimento – Pároco da Igreja do Divino Espírito Santo – Ouro Branco/RN
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